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Estatais são “cabides de emprego” ou elas têm suas funções?

Brasil
Foto: Imagem ilustrativa/SCTodoDia

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Estatais são “cabides de emprego” ou elas têm suas funções?

O uso das estatais e empresas públicas pelos governos para beneficiar partidários ou como moeda de troca para apoio político é recorrente

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O uso das estatais pelos grupos políticos no poder é uma prática recorrente para favorecer correligionários políticos, prática de nepotismo e também moeda de troca na hora de buscar apoio político no Congresso Nacional e Senado. Exemplo disso foram as recentes nomeações de 35 pessoas ligadas ao PT e ao atual governo para cargos estratégicos dentro da Petrobras. 

O assunto pautou o editorial do jornal Estado de S. Paulo na última terça-feira (3), que tratou a estatal como “cabideiro do PT”. No entanto, essa prática não é exclusiva do atual governo.

O professor da Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e advogado Ricardo Bruno Boff, mestre em Relações Internacionais, diz se tratar de uma prática bastante antiga. “Alguns chamam de patrimonialismo, que seria a prática de se tratar o público como se fosse privado”. 

A explicação, segundo o especialista, é simples: o político ou a família influente em um determinado meio vai loteando os cargos para benefício próprio, colocando parentes, amigos, pessoas da mesma religião. “Independentemente de quem seja, as pessoas vão colocando os seus nos cargos, o que é uma prática nociva, porque a meritocracia deixa de existir”, destaca o professor. 

Outro ponto elencado por Ricardo é que, além dos cargos nomeados a pessoas por pertencerem aos partidos, terem feito campanha ou por terem uma carreira ligada às siglas partidárias, tem as nomeações feitas para o favorecimento de casos de corrupção, rachadinhas ou outras ações ilícitas. “No entanto, essas práticas estão cada vez mais difíceis, dado que os controles melhoraram.” 

Ele destaca, no entanto, que, na maior parte dos casos, as nomeações acabam sendo usadas como moeda de troca. “Ainda mais nesse presidencialismo de coalizão, em que todos os presidentes, dos anos de 1980 prá cá, têm congressos muito fragmentados e precisam se utilizar dos cargos para obter maioria.”

Os controles hoje são mais eficientes

Ricardo Boff destaca, no entanto, que isso vem diminuindo nos últimos anos, devido à melhor estruturação das empresas. “Exemplos são a Petrobras, o BNDES, e muitas outras empresas, que mesmo que eventualmente tenham problemas, são empresas que profissionalizam muito suas gestões”, destaca. 

O professor diz ainda que os concursos públicos vem selecionando pessoas preparadas e que, uma vez dentro da empresa pública ou estatal, eles têm uma tradição a seguir. “Isso favorece que os servidores tenham uma boa formação e as instituições funcionando com rotinas e controle bastante fortes”. 

Ricardo lembra que muitas pessoas que defendem as privatizações a qualquer custo usam essas falhas para justificar a desestatização, mas alerta que a privatização também tem problemas. “A empresa privada quer lucro a qualquer custo e nem sempre ela vai atender as populações mais pobres, porque elas não dão o retorno que uma área rica dá. As empresas públicas têm uma função e o caminho é a profissionalização, os concursos, os controles”, arremata.

contexto histórico

O advogado e cientista político Roberto Wöhlke, mestre em Sociologia Política, diz que a tradição de nomeações de pessoas com laços familiares ou com outras formas de ligação está intimamente ligada à estrutura social do Brasil, que é uma herança não apenas dos lusitanos, mas também do modo de pensar colonial monárquico. “É a monarquia, com sua excelência e superioridade, e aqueles que se submetem a ela. Isso passou pelo entrave da nossa burocracia, inclusive na ideia da república”, pontua. 

Wölke associa o patrimonialismo ao regime republicano e diz que isso permeou e permeia a nossa história. “É o público que continua sendo tratado como privado”, reforça. “Isso remonta toda a nossa tradição e o sentimento do Estado como uma extensão da família e cai exatamente nessas relações institucionais”. 

Essa tradição, segundo o especialista, vem ao encontro do que acontece no Brasil contemporâneo, “o compadrio no preenchimento das chefias e cargos estratégicos nas estatais e empresas públicas.” 

Wölke diz que de uns anos pra cá vem se tentando, por meio de reformas na legislação, porém ainda muito aquém, acabar com esse “patrimonialismo”, ou pelo menos minimizar o problema. Ele cita o recém criado Estatuto das Empresas Públicas, que coloca critérios técnicos e objetivos, e até meritocráticos, para a escolha de bons gestores. 

“Mas isso ainda não é suficiente, porque esse tradicionalismo remonta de muito tempo e só vem nos prejudicar, porque o sentido republilcano e o sentido da gestão pública não estão sendo observados do ponto de vista constitucional”, completa Wölke.

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