Cidadania
Tios são condenados após pedirem guarda dos sobrinhos e os “devolverem” ao abrigo
Casal deverá pagar o equivalente a 15% de um salário mínimo mensalmente a cada um dos sobrinhos
Por
Érik Borges
Pedro e Cecília foram abandonados pela mãe e criados pela avó. Os irmãos viviam em situação risco e negligência e teriam sido agredidos e abusados sexualmente. O pai das crianças não possuía interesse em exercer a guarda deles. Os irmãos então foram retirados do poder familiar e passaram a viver em um abrigo.
Antes mesmo de ficarem disponíveis para adoção, uma tia se colocou à disposição para ter a guarda dos dois e acolhê-los em sua casa. Ocorre que, um ano e meio após estarem morando no novo lar, os irmãos foram devolvidos ao abrigo pela tia e pelo esposo, que alegaram “não aguentar mais olhar na cara deles”.
A situação que choca os leitores ocorreu na Comarca de Laguna. Os nomes fictícios foram usados para contar a real história de dois irmãos que hoje tem 11 e 12 anos e voltaram a viver em um abrigo. Acompanhando a situação, o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), por meio da 3ª Promotoria de Justiça de Laguna, ajuizou uma ação civil pública e conseguiu a condenação liminar da tia ao pagamento mensal de 30% do valor de um salário mínimo aos irmãos. O MP aguarda ainda o julgamento do pedido de indenização por danos morais.
“A conduta da tia não só violou os princípios básicos da proteção e do cuidado infantil, como também intensificou a vulnerabilidade da criança e da adolescente envolvidas, perpetuando o ciclo de traumas e abandono aos quais já haviam sido submetidas. Não estamos tratando de simples objetos, que podem ser devolvidos a qualquer tempo, mas sim de sujeitos de direitos e com sentimentos”, comenta a Promotora de Justiça Fabiana Mara Silva Wagner.
Situação pode acarretar problemas psicológicos e afetivos
Para a neuropsicopedagoga, Bruna Botega Fortunato, a devolução de uma criança adotada pode causar problemas psicológicos e afetivos, como frustração e abandono. Ela explica que a criança pode apresentar problemas comportamentais, confusão de identidade e dificuldade de concentração; dificuldade de formar vínculos, pode ter medo de novos abandonos e rejeição, o que pode dificultar a formação de novos vínculos; pode ainda passar por crises, como inquietação no colégio, brigas com colegas e professores. “É como uma bomba para a autoestima da criança, essa é a melhor expressão, para definir o que uma criança adotada suporta com a devolução”, reforça Bruna.