Um dos filmes mais aguardados do ano, O Agente Secreto chegou aos cinemas nesta quinta-feira (06). Dirigido por Kleber Mendonça Filho, cineasta conhecido principalmente por Bacurau e Aquarius, o longa foi escolhido para representar o Brasil na disputa por uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Internacional no ano que vem – e, pelo andar da carruagem, deve aparecer também em outras categorias do prêmio da Academia.
Mas, premiações a parte, já dá para dizer que o filme é uma espécie de fenômeno muito bem vindo ao cinema brasileiro. Não necessariamente pela estreia no topo das bilheterias, resultado de um trabalho de divulgação ainda incomum no cenário nacional, ou pelo desempenho em festivais importantes como o de Cannes (de onde saiu com dois prêmios), mas sobretudo pela discussão capaz de produzir enquanto obra em si. O cinema morre um pouquinho sempre que se torna apático, e esse adjetivo, felizmente, não pode ser utilizado para descrever O Agente Secreto.
O filme se passa em Recife no ano de 1977 e acompanha Marcelo (Wagner Moura), um professor que vai para a capital pernambucana com o objetivo de se esconder dos seus perseguidores para, então, deixar o país em segurança com o seu pequeno filho. Enquanto se esconde ao lado de outros perseguidos pela Ditadura Militar, ele procura pelo único registro documental da sua falecida mãe e relembra as ações que o levaram até aquela situação, ainda longe da tão aguardada segurança.
Assim como em outros trabalhos de Kleber, a memória também é um elemento extremamente importante e sentimental na construção de O Agente Secreto. Se em Aquarius ela representa um caminho para a resistência e em Retratos Fantasmas a janela para pensar as transformações de uma cidade e suas pessoas, neste filme ajuda a desvendar as muitas violências de um país mergulhado em uma ditadura.
Violências que, mesmo quando manifestadas nas pequenas coisas da vida, como não poder dizer o próprio nome diante das pessoas com quem você acabou de criar um vínculo, ainda assim representam a impotência de um Brasil que, naquele momento, se via distante da sua redemocratização.
Foto: DivulgaçãoE não é preciso ser ou conhecer Recife para entender a paixão que Kleber tem pela sua cidade e a importância que esta possui em O Agente Secreto. Uma das violências cuja memória revela no filme também é a de uma capital pernambucana que, apesar de linda e pulsante mesmo durante os anos de chumbo, se encontra inacessível para pessoas como Marcelo. É como ver a felicidade no seu entorno e não poder de fato desfrutá-la.
A oralidade também possui um papel muito relevante dentro do filme. É por meio de depoimentos gravados ou conversas em uma sala de refugiados que as histórias são descobertas, se transformam em mitos e o passado se relaciona com o presente.
Mas o grande acerto de Kleber na direção do filme é, sem sombra de dúvidas, conseguir contar essa história sem abrir mão de todos os maneirismos visuais que consolidaram a sua carreira. O Agente Secreto tem ares de um thriller policial, cenas de faroeste e toques de um drama que são embalados por frevos, split diopters e telas divididas.
Uma história que, ainda que tão carregada de dramas, em momento algum deixa de ser visualmente interessante. O diretor sabe que a Recife é bonita demais para ter as suas belezas esquecidas, seja no interior de um apartamento ou pela janela da sala de projeção de um cinema.
Wagner Moura, que deve ser indicado ao Oscar de Melhor Ator, entrega aqui uma das melhores atuações da sua carreira. Um homem que, apesar de contido, carrega um ódio dentro de si manifestado por meio da tristeza. Mas quem rouba a cena quando está em tela é Tânia Maria, no papel de Dona Sebastiana, e Alice Carvalho, cujos olhos são tão expressivos que não precisam de muito mais do que dois minutos para te cativar.
O Agente Secreto talvez só não seja perfeito por conta do seu final anticlimático. Não exatamente pela decisão de como encerrar essa história, trazendo o presente para então olhar para as violências do passado, mas sim por destoar visual e sentimentalmente de todo o restante do longa. Não apaga, mas prejudica um filme que, mesmo assim, é um dos melhores do ano.
Nota: 4,5 / 5
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O Agente Secreto está disponível nos cinemas. Confira o trailer: