Salvamento de baleia abre debate: ajuda ou infração?

Voluntário libertou baleia-franca presa em rede em Palhoça, mas pode ser punido por agir sem autorização

Leticia Matos

Publicado em: 14 de julho de 2025

5 min.

Um resgate corajoso chamou atenção neste fim de semana em Palhoça, na Grande Florianópolis. Um homem, usando apenas uma prancha de stand up paddle e uma faca, libertou uma baleia‑franca e seu filhote de uma rede de pesca na Praia da Pinheira. A ação ocorreu no domingo (13), após três dias de monitoramento por órgãos ambientais. O caso, no entanto, levantou uma questão delicada: até que ponto a iniciativa popular pode substituir o protocolo oficial?

Em nota, o Ibama afirmou que a atitude do voluntário, embora bem-intencionada, pode configurar infração ambiental. Isso porque a legislação brasileira exige autorização específica para qualquer intervenção com mamíferos marinhos, visando garantir tanto a segurança do animal quanto do humano envolvido. Segundo o órgão, um procedimento administrativo foi instaurado para apurar a responsabilidade pela ação.

O órgão explicou que o monitoramento havia sido mantido desde quinta-feira (10), com apoio do Corpo de Bombeiros de Santa Catarina, e que havia expectativa de a rede se soltar naturalmente com o atrito do animal, sem comprometer a mobilidade da baleia ou os cuidados maternos com o filhote.

Legislação e riscos do amadorismo

A instrução normativa nº 146/2007 do Ibama determina que apenas instituições cadastradas e com técnicos capacitados podem realizar intervenções diretas em animais marinhos. O objetivo é evitar riscos de lesão, infecções ou até morte tanto para o animal quanto para quem tenta ajudar.

Para o biólogo Milton Marcondes, do Instituto Baleia Jubarte, a emoção do momento pode levar a atitudes precipitadas: “Mesmo bem-intencionado, quem se aproxima de uma baleia pode se colocar em risco ou agravar o problema. São animais gigantes e imprevisíveis, especialmente quando estressados”.

Santa Catarina no centro da migração das baleias

A costa catarinense, especialmente entre Palhoça e Imbituba, é reconhecida como berçário natural da baleia-franca. A temporada de observação vai de julho a novembro, período em que mães e filhotes ocupam águas rasas para amamentação. A APA da Baleia Franca, sob gestão do ICMBio, monitora a presença desses animais há anos, mas ainda enfrenta desafios com redes de pesca ilegais ou abandonadas, principal ameaça às baleias na região.

Sociedade entre o instinto e a lei

O vídeo do resgate viralizou nas redes, dividindo opiniões: de um lado, aplausos pela bravura; de outro, críticas ao desrespeito aos protocolos. A situação expõe uma tensão crescente entre o impulso de ajudar e os limites impostos pela legislação ambiental.

E se ninguém tivesse agido?

Essa é a pergunta que muitos moradores de Palhoça têm feito. O caso reacende o debate sobre a agilidade dos órgãos públicos e a participação da sociedade na preservação ambiental. A natureza, muitas vezes, não espera licenças para ser socorrida. Mas a lei, por outro lado, existe para garantir que a ajuda realmente ajude.

Conclusão: salvar ou esperar?

A resposta talvez não esteja nos extremos. Enquanto o Ibama apura a conduta do socorrista, o caso serve de alerta para que Santa Catarina invista em protocolos mais céleres, campanhas educativas e eliminação de redes abandonadas no mar. Porque proteger a vida marinha não deve ser um ato de desobediência — mas sim uma política de Estado.



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