Salvamento de baleia abre debate: ajuda ou infração?
Voluntário libertou baleia-franca presa em rede em Palhoça, mas pode ser punido por agir sem autorização
Um resgate corajoso chamou atenção neste fim de semana em Palhoça, na Grande Florianópolis. Um homem, usando apenas uma prancha de stand up paddle e uma faca, libertou uma baleia‑franca e seu filhote de uma rede de pesca na Praia da Pinheira. A ação ocorreu no domingo (13), após três dias de monitoramento por órgãos ambientais. O caso, no entanto, levantou uma questão delicada: até que ponto a iniciativa popular pode substituir o protocolo oficial?
Em nota, o Ibama afirmou que a atitude do voluntário, embora bem-intencionada, pode configurar infração ambiental. Isso porque a legislação brasileira exige autorização específica para qualquer intervenção com mamíferos marinhos, visando garantir tanto a segurança do animal quanto do humano envolvido. Segundo o órgão, um procedimento administrativo foi instaurado para apurar a responsabilidade pela ação.
O órgão explicou que o monitoramento havia sido mantido desde quinta-feira (10), com apoio do Corpo de Bombeiros de Santa Catarina, e que havia expectativa de a rede se soltar naturalmente com o atrito do animal, sem comprometer a mobilidade da baleia ou os cuidados maternos com o filhote.
Legislação e riscos do amadorismo
A instrução normativa nº 146/2007 do Ibama determina que apenas instituições cadastradas e com técnicos capacitados podem realizar intervenções diretas em animais marinhos. O objetivo é evitar riscos de lesão, infecções ou até morte tanto para o animal quanto para quem tenta ajudar.
Para o biólogo Milton Marcondes, do Instituto Baleia Jubarte, a emoção do momento pode levar a atitudes precipitadas: “Mesmo bem-intencionado, quem se aproxima de uma baleia pode se colocar em risco ou agravar o problema. São animais gigantes e imprevisíveis, especialmente quando estressados”.
Santa Catarina no centro da migração das baleias
A costa catarinense, especialmente entre Palhoça e Imbituba, é reconhecida como berçário natural da baleia-franca. A temporada de observação vai de julho a novembro, período em que mães e filhotes ocupam águas rasas para amamentação. A APA da Baleia Franca, sob gestão do ICMBio, monitora a presença desses animais há anos, mas ainda enfrenta desafios com redes de pesca ilegais ou abandonadas, principal ameaça às baleias na região.
Sociedade entre o instinto e a lei
O vídeo do resgate viralizou nas redes, dividindo opiniões: de um lado, aplausos pela bravura; de outro, críticas ao desrespeito aos protocolos. A situação expõe uma tensão crescente entre o impulso de ajudar e os limites impostos pela legislação ambiental.
E se ninguém tivesse agido?
Essa é a pergunta que muitos moradores de Palhoça têm feito. O caso reacende o debate sobre a agilidade dos órgãos públicos e a participação da sociedade na preservação ambiental. A natureza, muitas vezes, não espera licenças para ser socorrida. Mas a lei, por outro lado, existe para garantir que a ajuda realmente ajude.
Conclusão: salvar ou esperar?
A resposta talvez não esteja nos extremos. Enquanto o Ibama apura a conduta do socorrista, o caso serve de alerta para que Santa Catarina invista em protocolos mais céleres, campanhas educativas e eliminação de redes abandonadas no mar. Porque proteger a vida marinha não deve ser um ato de desobediência — mas sim uma política de Estado.